TEXTO ESCRITO E CORRIGIDO POR UMA PACIENTE DE DISTÚRBIO
ESPECÍFICO DA LINGUAGEM, HOJE COM 27 ANOS.
Como foi a minha formação
Eu era uma criança completamente normal que tirava boas
notas no Jardim de Infância, até que chegou a alfabetização e não conseguia
entender aquele código. Eram vários sons que eram representados em um desenho
que se chamava letra: Nossa! Não conseguia ter uma lógica, uma associação para
conseguir aprender. Outro problema para mim era na fala, trocava todos os sons,
como era difícil falar “secretária”! Eu sabia que eu não tinha a mesma
capacidade de aprendizado na fala e na escrita do que uma criança convencional,
mas sabia que no fundo era inteligente e que um dia todos iriam reparar.
Sem saber o porquê da minha dificuldade fui buscar ajuda,
meus pais me colocaram em Fono, Psicóloga e em bons colégios. Ninguém sabia o
que eu tinha, nem a minha antiga Fono. Fiz testes de surdez, fiz teste de QI e
tudo dava normal, ou um pouco acima da média. Resultado disso, não tive outra
solução a não ser aceitar minha deficiência e encará-la de frente. Demorei 2
anos e meio para conseguir me alfabetizar, e mesmo quando eu aprendi a ler
ainda tinha muita dificuldade. Eu gaguejava muito, e como minha professora da 4ª
série sempre pedia para eu ler na frente da sala.la dava bronca em quem fazia
Bulling e mandava repetir até conseguir. Me lembro quando eu consegui entender
todas aquelas letras das placas de sinalização, ainda não tive maior
satisfação, fiquei tão feliz! Eu percebi que apesar de muito esforço eu estava
lendo e escrevendo, e quanto m ais eu treinava mais eu conseguia aprender.
Aquilo me deu tamanha satisfação que lembro de estudar 8 horas por dia todos os
dias para conseguir tirar 7 ou 8.
Tive que ser extremamente organizada para mapear tudo aquilo
na minha cabeça. Acabei saindo da Fono e da Psicóloga porque não via melhora.
Infelizmente não me deram os exercícios adequados que me
ajudassem. Comecei a decorar todas aquelas letras e sons. Desenvolvi um método
próprio para conseguir associar a palavra à figura, exemplo: “cavalo” se
escrevia “cavalo” e associava ao som “cavalo” e a imagem do animal. Um processo
demorado e cansativo, mas que consegui vencer meus obstáculos. Depois de anos
fui entender que o “c” com “a” faz o som de “ca”.
Eu descobri que tenho Distúrbio Específico de Linguagem
(DEL) com 25 anos em 2012. Apesar de ter vencido várias dificuldades eu ainda
tinha muita dificuldade para me expressar. E ao formar frase, eu ainda pensava
de trás para frente, exemplo: eu pensava “sua casa eu vou”, posteriormente reestruturava
e falava “eu vou para sua casa”, e quando eu lia um texto precisava reler três
ou quatro vezes para ter a compreensão do mesmo.
Há um ano e meio que estou fazendo Fono e todos já
comentaram que estou me expressando muito melhor, você tem sempre que estudar
para não regredir e melhorar sua fala e escrita. Aprendi inglês tarde, com 20
anos, e precisei morar um ano na Nova Zelândia para pegar fluência, faz 7 anos
que estudo inglês e não sou fluente, mas consigo me comunicar muito bem.
Normalmente as pessoas me perguntam: “Nossa! Como você lidou
com isso? Você era apenas uma criança e não tinha o tratamento apropriado, e
ainda parecia ter problemas com sua autoestima”. Sinceramente não foi bem assim
até os 24 anos, eu sempre achei que fosse burra mesmo, e para ninguém descobrir
isso, me dediquei muito além do normal. Quando descobri que tinha “DEL” fiquei
muito aliviada e falei para todo mundo: “Viu! Sabia que não era falta de
inteligência, eu só raciocino de uma forma diferente”.
Até os meus 24 anos eu lidava como se fosse uma deficiência,
como se eu fosse uma pessoa limitada na linguagem e sempre que alguém ria de
mim eu pensava: pelo menos estou fazendo essa pessoa feliz e descontraindo o
ambiente. Desde que me entendo por gente eu era motivo de piada e fiz questão
de reforçar o meu cargo de palhaço na vida. Comecei a notar que poucas pessoas
tinha a capacidade de ser espontânea, queria fazer com que os outros rissem e
fazer as pessoas felizes perto de mim. Acabei descobrindo que para você ser
amado e aceito na sociedade basta você ser você mesmo e aceitar suas limitações
e não escondê-la, e trabalhando-as para sempre melhorar como pessoa e
profissional. Hoje trabalho em uma grande empresa, já me graduei e atualmente
faço pós de gerenciamento de projeto na FGV e pretendo fazer mestrado fora do
país.
Aprendi a lidar com medo para me impulsionar para frente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário